Pedaços de Tempo ... Pedaços de Nada ... Pedaços de Tudo

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Desabafo de uma professora desalentada

Porque estou indignada e porque escrever sempre me acalmou e sossegou a alma...

Sou PROFESSORA, tenho 15 anos de serviço, quase nada comparado com tantos outros colegas de profissão. Já dei aulas a todos os níveis (do 7º ao 12º), a todos os cursos, já participei activa e entusiasticamente em projectos que fiz nascer, outros que acarinhei e quando os colegas mais velhos sentenciavam "ah isso é porque ainda és nova, vais ver daqui a uns tempos" ( e os tempos eram outros...) eu sorria e pensava para mim "eu nunca vou ser assim, desalentada".

Hoje quem escreve é uma professora zangada, desmotivada e sobretudo indignada com a falta de respeito que se tem por esta profissão neste país, começando por aquele que devia ser o principal protector da instituição que é a Escola: o Estado.

O motivo? Podia ser um de entre tantos, mas hoje é este: um calendário, o dos exames nacionais do ensino secundário, exames que serei professora classificadora nomeada pelo Director do meu estabelecimento de ensino (sabendo que o faz em consciência, cumprindo com os critérios pedidos e consideração) cargo que sou obrigada a aceitar no âmbito dos deveres da profissão (este facto ainda por esclarecer) e a assinar um contrato de 4 anos, de deveres e sem direitos.

Os pormenores: o exame da disciplina que serei classificadora realiza-se no dia 27 Julho de 2011, ora eu não sei (ou melhor talvez saiba, ou desconfie) como é a vida dos Srs que elaboram estes calendários mas a minha conheço bem, tenho dois filhos que iniciam férias no final de Junho e que são privados da mãe tantas vezes durante o ano porque há testes e fichas e trabalhos para corrigir, reuniões para comparecer, relatórios para preencher, actas a fazer e ainda por cima não pode faltar (como os outros encarregados de educação) ao trabalho para as actividades da escola deles e até comparecer às suas reuniões.
Como explicar também aos meus que agora também das férias de Verão me querem roubar parte?!

Mas estamos em Portugal e por esta altura (se é que alguém lê estas coisas soltas) já se levantam vozes "acho muito bem, os professores não fazem nada, vão dar umas aulas e já está e têm férias três vezes por ano, queixam-se de quê..."
Esquecem-se que qualquer trabalhador pode tirar férias na altura que bem entender do ano, nós não. O tempo que chamam de férias (pausas lectivas) a maioria de nós passa a preparar as aulas do período seguinte e a organizar as coisas que não teve tempo antes já que durante os períodos lectivos estamos demasiado "ocupados" em ser administrativos, educadores, psicólogos, assistentes sociais, e alguns até empregados de limpeza. E não, não estou a exagerar!

Ser professor neste país é ser isto mesmo e ainda mais, é ser bode expiatório de todas as políticas educativas, e ainda ter que enfrentar todos dias alunos que não querem ir à escola, não querem estudar, são mal educados e o único objectivo que têm na vida é ter dinheiro a qualquer preço, de preferência sem trabalho. Alunos que faltam meses às aulas mas que ainda podem ser salvos por um qualquer milagre previsto na lei e ainda se riem dos parvos dos professores que passaram o seu tempo a elaborar planos de recuperação/acompanhamento e o raio que o parta.

Perdoem-me aqueles que não são assim, felizmente que os há, mas são poucos, muito poucos... cada vez menos... (pelo menos no ensino público)
E se antes ainda valia a pena hoje em dia não me chega.

Somos muitos professores a ganhar o mesmo mas enquanto eu estiver em Agosto a classificar talvez 60 provas de exame, haverá outros que estarão com as famílias de férias e no final do mês o pagamento será o mesmo. Se isto não é injustiça é o quê?!

Mais, terei que assinar um contracto de 4 anos para ser classificadora de uma disciplina que se calhar não darei mais pois com os projectos que o Estado tem para a remodelação dos currículos provavelmente ficarei sem horário na escola secundária onde estou e terei que ir para a básica do agrupamento ou seja, nem professora do secundário serei, mas isto faz algum sentido?!

Em 15 anos tive muitos momentos bons, passaram-me pela mão excelentes pessoas, ganhei grandes amigos (colegas e alunos) mas para mim neste momento acabou.

Alguns pensarão que estou a exagerar, a dramatizar, mas quem me conhece sabe que eu sou assim e esta foi a última enorme falta de respeito (e nem falei nos cortes de ordenado, da avaliação dos professores, na formação...)

Hoje a Escola como instituição não me diz nada e isso deixa-me sobretudo triste porque eu preciso de acreditar nas coisas mas neste momento não consigo acreditar em nada. Sinto-me profundamente desrespeitada.

Não quero que os meus filhos cresçam e sejam educados num país assim, lamento profundamente e no que depender de mim tudo farei para que este não seja o futuro deles, porque isto não é futuro.

Radical, exagerada, desalentada, o que quiserem...

Hoje perdi um pouco de mim!




1 comentário:

GK disse...

Hang in there, friend.
Sabes, há outra vida.
E vamos encontrá-la...
:(